sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Contato, Vividos e Sombras



Seria mais um dia como outros se não fosse o encontro presente com o tempo de outro. A entrada na sala mobiliada com móveis retrôs, combinado com as obras modernas penduradas na parede cinza claro e o abajur de baixa luz, fazia-me sentir o tônus rígido de desgarrar-me de meu tempo e deleitar-me com a possibilidade do tempo do outro. Tamanha petulância esta, que me tirava o foco daquilo que seria uma mistura de tempos, que tornariam o momento inédito, que atrairiam sombras de passados, de mim e do outro, tornando isso que seria inédito, velha experiência, sucumbiria à imediata prole de fazer do velho algo novo.
Aliás, é necessária a refração de luz para que as sombras se façam presentes, e naquele momento o que me atraia era a possibilidade de utilizar da luz baixa do abajur para fazer sombras. Faltavam ainda cinco minutos para estar sentado a minha frente um conjunto de vividos, um conjunto de experiências e formas. E ali sentado, sentindo o peso do meu corpo fazendo pressão sob minhas nádegas, eu aproveitava a chance de que a luz baixa me oferecia, para perceber as formas de minhas sombras. Observei os contornos, brinquei de apagar e acender o abajur, e observei que as sombras continuavam iguais.
Não sei por que cargas d’água tivera a inocência de achar que ficar parado – com a pressão que estava sentindo sobre as nádegas – gozando do poder que o botão do abajur me oferecera de ver sombras, pudesse de algum modo modificá-las ou compreendê-las. Parece-me óbvio de que na realidade, de inocente não possui nada! Pois, na verdade apertar o botão não me trazia poder algum, pois eu sabia que ficar parado com a luz baixa do abajur acesa, faria observar os mesmos contornos das sombras, e que quando desligado o botão, o que restara na memória era a imagem da projeção do meu corpo cada vez mais pesado.
 Mas, sem saber o que isso significara, naqueles cincos minutos de espera das sombras do outro, fiz-me perceber quase que subitamente, que quando o abajur estava desligado, isso não fazia das sombras que tivera visto um fato, pois, acabara de me dar conta de que as sombras são maiores quando mantenho o abajur desligado. Perceber meu corpo, com o tônus cada vez mais rígido, quase que preso na cadeira daquela sala, me fez ter uma mescla de sensações, duas me era sobressalientes: o medo e o conforto.
Nunca imaginei que poderia sentir as duas coisas juntas, mas me era cara a ideia de que mesmo sem a luz baixa do abajur as sombras permanecessem ali – maiores do que nunca – tomando todo o ambiente, tomava-me, engolia-me sem piedade, e quanta piedade eu gostaria de ter tido de mim mesmo naquele momento! Por outro lado, a lembrança do contorno do meu pesado corpo, projetado na parede cinza claro, me trazia a sensação de que as sombras que me envolviam não eram só minhas, eram de todos que quisessem desfrutá-las, mesmo que naquele espaço de tempo era eu que me fazia presente na penumbra silenciosa – que de tão silenciosa escutava seus barulhos.
Perplexo, de que as sombras existem para deixar em evidência o corpo pesado, de que o peso do corpo se conforta quando a penumbra é maior, justamente por não deixar em evidência suas sombras projetadas, criadas pelo peso sobre as nádegas. Os cinco minutos passaram. E quando percebi, estavam em minha frente outras formas de sombras – a sombra do outro que esperava deleitar-me. Foi impressionante ao observar que o corpo do outro, tão pesado quanto o meu! Tinha um contorno de sombra com cor idêntica àquela de meu corpo sentado que teimava em pressionar minhas nádegas.

 A luz do abajur começou a piscar, e as sombras pareciam sumir e voltar rapidamente, a lâmpada apagou-se como se quisesse afirmar que de nada adiantara ter tido a inocente sensação do poder ao apertar o botão – a luz cessou. O inédito obrigou-me, mesmo por breves minutos, ficar com a sensação de duas sombras de corpos pesados mesclados na penumbra agigantada. Fiquei imaginando que quando a luz voltasse, as sombras estariam abraçadas com piedades das nádegas esmagadas, que pareciam cada vez mais sustentar o peso de todas as sombras juntas, as minhas, do outro e de outros tantos. Mas, quando a luz voltou, os contornos conhecidos apareceram de um jeito diferente, pois os corpos não tendo como sustentar o peso de duas sombras abraçadas – sobre as nádegas – mudaram de posição. Entendi para que serve a penumbra e a refração da luz sobre os corpos...

27/11/14

Valsa




No toque dedilhado do violão,
Ressonou o valseado,
O bumbar do coração,
O balanço compassado,
Um pra lá, Um pra cá!

Na voz sensual que repercutia,
As vestes leves circulavam,
Como um assopro que envolvia,
Os corpos se conduziam,
Rodeado para lá, Rodeado para cá!

Na leviandade do passo,
Pelas pontas dos pés conduzidos,
No limiar do espaço,
Bailados saudosamente abrangidos,
Para cima, para baixo!

Nos olhares um ao outro fixados...
A paisagem ao fundo modificada,
Entrelaçados os braços, suavemente elevados,
Nos ombros a mão delicada,
Para um lado, Para o outro!

No finalizar do toque musical,
Parados em passos perfeitos,
Lábios próximos, sorriso real,
Contato da pele, ambos satisfeitos.
Da paixão, ao amor!


Ematuir Teles de Sousa

22/07/2012

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Chamas de Mim



Este fogo que elevou a alma,
Me trouxe o calor ardente
E ter-te junto a mim!
Tive o vento que assoprava forte
E alastrava as chamas
Em direção sem fim!
Entreguei-me as labaredas quentes
Deste sentimento e em todos os momentos
Quis ficar assim!
Este mesmo fogo que abrasava a vida
transformou-me em cinzas
E hoje estou aqui.
Procurando a direção do vento
Que aumentava as flamas
E esquecia o mundo!
Atrás da fumaça errante do fogo incessante
Que corrói o peito,
Escondo-me e não me permito
Acender os lumes
Desta emoção;
De sentir esta mesma lástima
Que me fez resíduo, me despedaçou.
Tenho medo de que ao refazer as lascas
Reviverei as cinzas que o fogo custou.
Mas ao mesmo tempo
Busco em todo canto
Aquele encanto que o ardor causou,
E nesta ambigüidade triste
Eu me contradigo
E minto-me feliz!
É melhor acreditar que a brasa
Ainda reaviva em algum lugar,
Do que obscurecer-me em vida
Com as lavas do meu caminhar.
Eu tento consentir ao outro
Das centelhas que sobraram
Aumentar o fogo.
Mas ainda tenho o receio
De que estas chispas podem extinguir,
Aquilo que ainda restada destruição primeira,
Causa o devir.
E neste jogo dúbio entre o meu querer e o meu negar,
Vou seguindo a vida demonstrando aos outros
O mosaico que consegui montar.




Ematuir Teles de Sousa

04/09/2011

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Dedilhar



Uma música soa...
Lembranças de atos,
Um incômodo na garganta,
Como uma trava que prende um grito forte!
Embora o grito não saia em forma de som,
Ele está ali,
Como não é permitido sair deste jeito – tão natural (o grito)
Parece que ressoa dentro... Como é forte!
É possível senti-lo estremecer a carne,
As vísceras estão tomadas por estranhos calafrios...
Parece um vai e vem incessante que,
Ora pressiona o peito, ora a região dos olhos,
Os olhos estão quase prontos para receber o líquido...
Mas, devido à estranheza da sensação, algo o impede!
O coração salta num ritmo que toma o corpo todo,
É possível senti-lo na ponta dos dedos,
E é com estes dedos que tomo papel e caneta,
Ponho-me a escrever...
Consciente de que essa prática me é conhecida,
Tão conhecida pela necessidade de integrar afetos ainda sem nomes.
E por falar nisso,
A necessidade é de integrar e não de dar nomes,
Se nome tivesse,
Meus dedos não estariam sendo guiados,
E talvez esta seja uma bela prática que a vida me oferece...
A música ainda continua em meus ouvidos...
Mas agora o líquido está derretendo-se,
E escorre sem razão...
Escorre...
Corre...
Pinga como se nunca tivesse,
Um suspiro forte,
Termino mais um momento comigo,
Os dedos param!


Ematuir Teles de Sousa

12/11/2014